daisy jones e a rapaziada
#76: álbuns, livros e séries sobre bandas de mentirinha e de verdade, nessa edição recheada com esse tal de roque enrrol
olá vocês!
eu não sei vocês, mas eu sou a pessoa mais anti-hype que existe. não que eu seja o diferentão do rolê, que odeia tudo que tá na moda. acontece que eu não tenho tempo pra acompanhar tudo no momento que tá rolando. a galera falando de succession e eu ainda não vi nem game of thrones, e talvez nem veja. todo mundo falando de salvar o fogo e eu ainda tô absorvendo torto arado. os filmes da marvel mesmo só fui ver no ano passado e só agora eu fui conhecer melhor a jessie ware.
eu já me conformei que não vou ver, ler ou participar de tudo, pelo menos não coletivamente. e quer saber? dá até uma paz fazer tudo no meu tempo em vez de correr que nem um doido pra ficar por dentro de tudo. fomo nada, eu tenho é fome! eu sou tão atrasado nas trends que só agora eu me rendi a daisy jones & the six. o livro, porque a série eu devo ver lá pra 2026, sem drama. não dá pra ter tudo, a gente tem que escolher as nossas batalhas.
e como eu gostei muito da leitura, nesta edição eu vou falar de livro velho, se vocês não se importam. e aproveito o tema pra listar 10 bandas da ficção que deviam existir na vida real, desenterrar uma coleção de discos e recomendar uma série foda sobre rock latinoamericano. vem comigo!
daisy jones and the six, de taylor jenkins reid retrata uma banda dos anos 70 the six e sua ascensão e queda através dos olhos dos membros, especialmente da vocalista daisy jones. o romance é escrito de forma não convencional, como se fosse uma transcrição escrita de entrevistas com a banda, bem como outras figuras importantes da história. a formatação não apenas permite que o leitor sinta como se estivesse acessando a verdade crua sobre a separação da banda, mas também dá ao leitor um vislumbre de como era a fama (fictícia, claro) nos anos 70.
a história narra os bastidores da criação de aurora, álbum clássico do rock, claramente inspirado em rumors do fleetwood mac e em seguida, da turnê da banda, colhendo os louros da aclamação. egos inflados, ciúmes, picuinha, muita droga e pegação acabam por implodir precocemente com a banda e décadas depois os músicos se reúnem para contar cada um sua versão dos fatos.
fazia muito tempo que eu não lia um livro que, mesmo sendo puro entretenimento, também entregasse uma história cativante e personagens com mais de uma dimensão. então eu grudei em daisy jones e a rapaziada e não conseguia parar de ler. sabe aquele livro que vai chegando ao fim e vai te dando uma bad porque você não quer que acabe? esse é exatamente assim.
a minha segunda coisa favorita é que o livro não tem vergonha de ser pop, e a autora soube bem como criar e descrever o entorno de uma banda de rock na califórnia dos anos 60/70. como fã de the doors, me senti ali, andando de bar em bar, vendo aquela galera misturar trabalho e farra, numa época de muita liberação e experimentação.
a história se mostra convincente ao explorar facetas da indústria da música e apresentar tópicos polêmicos e complexos, como vício e como a fama afeta as pessoas. me impressionou a forma com que a autora representou pessoas anestesiadas com a fama e com seu próprio talento, recorrendo às drogas para se sentirem mais vivas. ao mesmo tempo, ela escreveu não apenas como o vício afeta uma pessoa, mas todos ao seu redor.
outro ponto a destacar é como um mesmo evento é narrado de diferentes maneiras, dependendo de quem conta a história. quem passou parte da vida vendo aqueles documentários da vh1 sobre os bastidores da música pop, vai dar boas risadas com este aceno a este tipo de documentário. as músicas são também um grande acerto e, por fim, há que se louvar a construção de boas personagens femininas, que têm tanto destaque na história quanto os homens. camilla, karen, simone e claro, daisy, são apaixonantes.
devo dizer que fiquei um pouco decepcionado com o final. todo o livro parece levar a uma razão supostamente insana de por que a banda se separou, mas não acho que entendi muito bem, ou não achei forte o suficiente. a ação deste ato me pareceu apressada demais. pra quem vinha degustando o desenrolar da trama pouco a pouco, parece que ficou faltando algo pra coroar a história.
recomendo demais a leitura de daisy jones & os caras, pois o formato é muito interessante e foge dos livros da narrativa tradicional. taylor jenkins reid arriscou muito e, na média geral, acho que ela conseguiu criar um ótimo romance. tem também uma série na amazon prime, mas eu não tô preparado pra ruminar toda essa história. melhor digerir bem o livro e retornar à série com outros olhos e ouvidos. tô curioso pra ver a neta do elvis presley dando vida à daisy jones? claro. mas sei que as músicas da série não são as mesmas do livro e isso me deu uma esfriada.
TOP 10
bandas da ficção que poderiam ser de verdade
daisy jones & the six, do livro de mesmo nome
spinal tap, do filme this is spinal tap
stillwater, de quase famosos
the wonders, de the wonders, o sonho não acabou
vagabanda, de malhação
hedwig and the angry inch, de hedwig - rock, amor e traição
school of rock, de escola de rock
josie and the pussicats, do desenho josie e as gatinhas
lemonade mouth, também nome do melhor filme do disney channel
marvin berry and the starlighters, de de volta para o futuro
HOMENAGEM
fantasminhas camaradas
dia desses alguém twitou que durante muito tempo a discografia dos mutantes andava sumida do mercado e falou que 98% das pessoas que amam mutantes devem sua paixão ao david byrne, que lançou uma coletânea na gringa, tirando a banda do ostracismo. e o usuário @ruffato respondeu com um fato irrefutável: muita gente (eu inclusive), só conheceu a banda por causa da saudosa coleção millennium.
e claro, isso me fez lembrar da época em que eu comprava cds avidamente pra tentar recuperar o tempo perdido na minha educação musical de ex-adolecrente. grande parte dos meus discos eram cds da série millenium e iam de cazuza, elis regina, tim maia, caetano, capital inicial, toquinho e vinícius, enfim, de um tudo. e claro, meu primeiro contato com os mutantes veio daí, do disquinho que arranhou de tanto tocar.
era de lei: caía o salário na conta, uma pequena parte ia para aumentar a coleção de cds. bendita lojas americanas com seus cds de nove e noventa. a história de como tantos medalhões da música brasileira foram parar em porta-cds de estantes mdf mogno nas salas do brasil é ótima. ali no finalzinho dos anos 1990, a polygram do brasil virou universal music, que para amortecer o peso de uma grande fusão, resolveu colocar todo catálogo na loja de uma maneira mais digamos, popular.
as lojas então foram invadidas por caminhões de coletâneas da gravadora. Como era virada de século e milênio, a tal série de coletâneas foi batizada de millennium - 20 músicas do século XX. foi um dos últimos suspiros da era do CD. uns anos depois coletâneas com 4 vezes mais músicas pipocavam no camelô. e logo depois o mp3 e discografias inteiras em um pendrive.
acho que a maioria de vocês não viveu ativamente esta época, mas era bem interessante. tenho muita saudade da minha coleção de cds, mas zero saudosismo, eu me adaptei muito bem ao streaming de música e só vejo vantagens. e não é como se cds tivessem desaparecido, eu posso sair e comprar um se eu quiser, não é contra a lei.
parte da identidade dos disquinhos era o visual digamos rústico: blocos de textos que pareciam saídos do word art e a arte, que deixava os artistas meio fantasminhas no meio, numa foto em preto e branco só da cabeça e parte do tronco. e o repertório era uma mescla de hits, músicas meio lado b, faixas ao vivo e raridades de fora da discografia oficial.
também tinha álbuns temáticos, como música romântica, novelas, rock… ás vezes a ordem não tinha lá muito sentido e a transição de uma para outra era meio doida, mas graças e eles eu conheci muito do que formou meu gosto musical.
links, links, links!
a colunista do uol letty organizou uma cronologia da história das mulheres no rock ’n’ roll, desde a década de 1930 até hoje. são nada menos que 100 nomes, catalogados e resumidos de maneira didática. é de 2020, mas tá bem completo.
o rock latinoamericano é um universo maravilhoso e totalmente autossuficiente e você precisa conhecer mais sobre ele. a série documental quebra tudo: a história do rock na américa latina relata em seis episódios o nascimento do rock produzido no continente e como ele foi evoluindo e sobrevivendo às ditaduras que dominaram a região nos últimos 50 anos. tá na netflix.
aproveitando, já deixo aqui a playlist da série, que vai de ritchie valens, da clássica la bamba, até o rap da calle 13, passando por clássicos oitentistas de los prisioneros e soda stereo, o progressivo de los jaivas e as mulheres que dominam muito bem a cena atual, como a mexicana julieta venegas. é dever de casa, mas você vai me agradecer depois.
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júnior bueno é jornalista e vive em buenos aires. é autor do livro cinco ou seis coisinhas que aprendi sendo trouxa, disponível em e-book na amazon.
Que bom encontrar outras pessoas que também estão "atrasadas" nas trends do momento, sem chance e sem vontade de tanto conteúdo em uma velocidade incompatível com a vida da mãe escritora brasileira rsrs
Eu curti muito a série, a Daisy Jones tá ótima e a trilha sonora ficou bem legal.