los cuatro guapos de liverpool
get back, a série, um ladrilho de strawberry fields em buenos aires, um johh lennon zumbi e a brasileira que cantou com os beatles
hey, dudes!
a primeira vez que ouvi uma música dos beatles foi hey jude. mas como eu estou sempre ouvindo as músicas certas pelas vias erradas, era a versão em português do kiko zambianchi, que assolou o país no fim dos anos 80. a segunda deve ter sido eu te amo, versão de zezé di camargo e luciano para and i love her. tempos depois, com o lançamento de anthology, o júnior de 13 anos conheceu maravilhado uma das melhores bandas do mundo. em 1995 eu passei uma semana indo pra cama bem tarde, tudo pra ver a série especial da globo sobre os 30 anos da banda.
desde então, tem um pouco das canções deles em muitos dos meus momentos, sejam alegres ou tristes. como a vez que eu presenciei um velhinho tocar love me do numa gaitinha, na frente de túmulo no cemitério da chacarita. ou a vez que do mais absoluto nada, uns rapazes no ônibus em são paulo começaram a cantar “all you need is love” e de repente quase todo mundo cantava junto, ou arranhava o pan pa ran ra ra.
ou a vez em que eu soube por mensagem que meu tio tinha um câncer terminal e eu estava a milhares de quilômetros de distância, sem grana para poder ir dizer adeus. nessa hora no metrô alguém tocava hey jude e na parte do “don’t carry the world upon your shoulders” eu desabei de chorar.
hoje eu só quero falar sobre eles. desculpa a monomania, mas na edição de hoje tem minhas impressões sobre get back, que finalmente terminei de ver, um museu pra conhecer em buenos aires, uma ideia bem bocó de filme e uma homenagem à groupie mais querida do brasil. come together, right now over me!
UMA RESENHA
o bbb dos beatles
finalmente assisti á série documental do peter jackson sobre os beatles e, apesar de incrivelmente longa, posso dizer: que troço emocionante! é muito bom poder ter acesso às imagens de bastidores que tavam ali, na encolha, e ninguém nunca tinha tido a coragem de tirar a poeira de cima e exibir pra todo mundo.
pra quem tá por fora, se trata de uma série documental com os bastidores de um álbum, let it be, e um especial para a tv inglesa em 1969, dos beatles. eles teriam menos de um mês para ensaiar um puta show e compor nada menos que 13 canções, ali no terço final da história da banda, quando ainda rolava o tesão de tocar junto, mas era possível antever, pelas minitretas e silêncios incômodos, que a coisa não ia muito longe. ou seja, um momento interessantíssimo para a história da música pop.
o bom do streaming é isso: tem umas coisas que são muito boas pra tv aberta, mas talvez não interessem a todo mundo, ou bem podiam ganhar as telas de cinema, mas teriam que sofrer uma infinidade de cortes pra caber no tempo máximo permitido para um longa. get back foi feita pra se ver devagar, se envolvendo com as emoções reais daquela banda, entre a euforia de compor um verso quase impossível á frustração de perceber que nem todos estão mais no mesmo ânimo.
e é isso que é o ponto alto do documentário: ver esses caras despidos da megalomania de rockstar e sendo somente uns bróder de menos de 30, tentando não surtar pra entregar um job que parece meio absurdo, mas que eles sabem que são capazes. e é desse corre-corre maluco que saem algumas das minhas canções preferidas dos besouros: let it be, i've got a feeling, two of us, don’t let me down e get back entre outras.
e o legal é ver outras versões que quase ganharam vida dentro do processo de composição. os caras simplesmente enfiavam umas palavras aleatórias na melodia até chegar à letra mais satisfatória. por aí a canção get back quase virou um hino acidentalmete racista, quando a idéia original era criticar políticos de direita com ideais xenofóbicos.
pra quem ama a banda, ter isso assim tão disponível é simplesmente ouro. mas pra quem não gosta tanto assim, vê-los repetindo por quase meia hora o verso “don’t let me down” sem sair disso é desesperador. é como ver um cozinheiro cortando cebola sem parar ou um pintor genial somente misturando tinta sem parecer ter um objetivo em mente. eu sou do primeiro time obviamente e até os momentos mais triviais, sobretudo estes, me encantam um monte.
reza a lenda que os beatles, ainda na fase boy band de terninho, eram tão requisitados que não podiam estar em vários lugares ao mesmo tempo. então a saída foi gravar apresentações ao vivo e mandar para as emissoras de tv. estava inventado o videoclipe. não dá pra confirmar 100% esta invenção, mas ao ver todo o processo de gravação e os bastidores de momentos históricos de uma das bandas mais queridas do mundo, posso afirmar que, sem querer, eles inventaram o reality show.
UMA PERGUNTA
qual é o seu beatle preferido?
eu sempre estou dividido entre o paul (letrista genial, carinha de bom moço, cabelo bonito) e o george (olhar enigmático, postura elegante, fica bem de bigode). embora me parta o coração que o ringo não seja o mais popular. é o mais engraçado, poxa, isso tem o seu valor. o john nunca foi meu favorito, não sei porque, só não dá liga mesmo. comente abaixo se você tem um que gosta mais.
UMA DICA DE BUENOS AIRES
um ladrilho a menos em strawberry fields
tá lá no guiness: a maior coleção de objetos relacionados aos beatles no mundo pertence ao simpático senhorzinho argentino rodolfo vazquez. ele é tão aficcionado pela banda que durante uma visita ao histórico orfanato strawberry fields em liverpool, (onde john lennon costumava brincar na infância e citou em strawberry fields forever), ele deu uma despistada no guia, foi para um cantinho e roubou um dos ladrilhos do pátio.
a memorabilia de rodolfo é tão vasta que ele, não tendo mais espaço onde guardar sua tão amada tralha, criou o museo beatle. situado a quatro quadras do obelisco, o museu tem grande parte de seus 7.700 ítens entre fotos, objetos pessoais e figurinos originais dos “cuatro guapos de liverpool” e claro, o ladrilho de strawberry fields. ao lado, o bar the cavern, (em homenagem ao pub onde os beatles começaram a tocar), tem decoração temática e volta e meia, uma banda cover se apresenta. é um passeio pra lá de interessante, não só pra ver pertences dos beatles, como para testemunhar a paixão de um fã.
UM ROTEIRO RUIM
o zumbeatle
uma banda de garagem brasileira, cover dos beatles viaja até a inglaterra pra atravessar a faixa de abbey road. numa fatalidade, joão leno, o vocalista é atropelado e a banda fica desfalcada. desesperados os músicos recorrem a um ritual de magia ancestral poderosa pra tentar trazer o amigo de volta (é um roteiro bem sessão da tarde, então digamos que eles descobrem uma lojinha dessas de magia que só existem em filmes, com um velhinho oriental atrás do balcão).
um dos rapazes da banda (provavelmente o que faz o cover do ringo, que é o alívio cômico do filme), tem uma ideia genial: e se ao invés de fazer reviver um cover do john lennon, porque não invocar o espírito do próprio john lennon? com um festival de bandas de colégio (lembre-se, é um roteiro bem sessão da tarde) se aproximando, seria uma chance de vencer o concurso. no começo tudo tranquilo, o “novo” joão leno logo se revela um grande cantor, cai de amores por uma gatinha de olhos puxados, organiza um manifesto a favor da paz no colégio, essas coisas.
o que essa galerinha muito irada não esperava é que o espírito reencarnasse como um zumbi. cada vez que lennon escuta uma versão amadora de hey jude ou alguém castigando yesterday, ele sai furioso atrás de cérebros e matando adolescentes em toda roda que se forma em torno de um violão. assustados os rapazes da banda recorrem ao velhinho oriental e descobrem que só um tipo de magia muito forte e ruim seria capaz de reverter o feitiço, mas antes do velhinho oriental revelar que magia é essa, a ligação cai.
nesse momento o zumbeatle furioso irrompe o quarto com um golpe na porta e parte furioso em direção aos rapazes. logo em seguida o impensável acontece: o celular de um deles começa a tocar e a música que ele tem como toque é a versão do paulo ricardo para imagine. essa é a magia muito forte e muito ruim a que o velhinho oriental se referia. como mágica, o zumbi começa a se dissolver lentamente.
the end
UMA HOMENAGEM
a garota mais sortuda do brasil
lizzie bravo foi uma entre milhões. cantora, colaborou com nomes da mpb como milton nascimento e zé ramalho, foi casada e teve uma filha com zé rodrix e, o mais fascinante, deixou sua voz em uma canção dos beatles. o ano era 1967. em vez de ganhar uma festa de formatura aos 16 anos, lizzie preferiu pedir aos pais uma passagem para londres. mal pôs os pés na capital inglesa, ela foi direto a abbey road.
nos três anos em que passou na cidade lizzie ia praticamente todos os dias à porta do estúdio, onde encontrava outros fãs que estavam no local. nesse tempo, acompanhou as gravações de sgt pepper's e do white album, pois o som muitas vezes vazava para a rua. como estavam lá todos os dias, pediram autógrafos, foram fotografados com eles, tornaram-se rostos familiares.
mas o melhor veio em um dia de fevereiro de 1968. paul mccartney saiu do estúdio e perguntou aos adolescentes sentados na porta: alguém aí atinge uma nota bem alta? lizzie e uma amiga inglesa se ofereceram como voluntárias. a música era across the universe, que john lennon considera uma das melhores que já escreveu.
as duas passaram o dia cantando o refrão “nada vai mudar meu mundo”, em uma rara situação em que os beatles pediram a alguém de fora do grupo para colaborar em uma música. a produção ficou a cargo do quinto beatle, george martin.
a versão foi lançada em dezembro de 1969, em um álbum beneficente do wwf. devido ao tema da vida selvagem do disco, sons de pássaros foram adicionados no início e no final da música. no entanto, para o álbum let it be (lançado em maio de 1970), o produtor phil spector removeu os vocais de lizzie e gayleen, bem como os pássaros, acrescentou uma orquestra e também desacelerou um pouco a gravação original.
mas a versão com os vocais de lizzie não se perdeu: é a que aparece na compilação dupla past masters e pode ser ouvida aqui. em 2008, a nasa transmitiu a música para a estrela polaris, a 421 anos-luz da terra. a voz da adolescente voou, literalmente, através do espaço.
de volta ao brasil em 1969, elizabeth bravo seguiu a carreira de cantora e, em 1971, deu à luz marya bravo, fruto de seu casamento com zé rodrix. maria também é cantora. há alguns anos, lizzie publicou suas memórias no livro from rio to abbey road. editado e vendido de forma independente, o trabalho de capa dura traz o diário de lizzie na época, um monte de fotos até então inéditas da banda e curiosidades incríveis.
eu tive a sorte de ter em mãos um exemplar, da luana, mulher do meu primo (e maior beatlemaníaca de todos os tempos) e realmente é um trabalho incrível e dedicado, coisa de fã apaixonada. lizzie morreu em outubro do ano passado, mas seu livro pode ser encontrado pelo email lizzie.bravo@gmail.com. é um lindo registro não só da banda mas da juventude de uma das garotas mais sortudas do mundo.
júnior bueno é jornalista e vive em buenos aires. é autor do livro cinco ou seis coisinhas que aprendi sendo trouxa, disponível em e-book pela amazon.
Os Beatles estão presentes na minha vida há bastante tempo: meu pai teve (e ainda tem) o "Abbey Road" (e o "Imagine") em LP desde antes de eu nascer. Mas só fui prestar mais atenção na banda ali no começo dos anos 90, junto com um amigo de infância e de rua. Foi quando tudo aconteceu ao mesmo tempo.
A TV Cultura tinha antigamente um programa chamado "Som Pop", apresentado pelo saudoso Kid Vinil e que passava no estado do Rio pela TVE, canal 2. Um dia, acho que em 1992, esse programa fez um especial sobre Beatles e Rolling Stones, que eu acabei gravando em VHS e assisti até quase arrebentar a fita.
O primeiro LP dos Beatles que tive (meu mesmo) foi uma coletânea de capa branca chamada "20 Greatest Hits", que tinha um encarte incrível, com as capas de todos os discos e o nome das músicas de cada um embaixo. Depois, numa certa época, cheguei a ter o "Please Please Me" numa troca que fiz com um amigo do meu irmão. Só que meus pais não gostavam que eu trocasse meus discos. Então tive o disco "escondido" (!), malocado no meio da minha pequena coleção, pra que eles não descobrissem. Aquele gostinho de contravenção infanto-juvenil.
Até 1994, mais ou menos, fui ouvindo tudo da banda que pude. Uma amiga dos meus pais tinha o "Help!" e o Álbum Branco. Um tio tinha o "Let It Be". E assim eu ia conhecendo, montando o quebra-cabeças da discografia dos caras. Quando não podia comprar os discos, ia na loja no centro de Itaperuna e pedia ao moço pra "passar" os LPs pra eu ouvir pelo menos um trecho das faixas (lembro de fazer isso com o "Beatles For Sale" e o "Rubber Soul").
Curiosamente, o "Anthology" veio num momento em que o meu frisson tinha se esvaído um pouco. Lembro de assistir aos episódios, mas naquela época eu tava ouvindo outras coisas. Até que a febre da Beatlemania atacou meu irmão mais novo, que começou a comprar tudo da banda em CD ali por 2000/01. E, por tabela, me pegou também. E tá assim até hoje. :-)
Ainda não parei pra ver o "Get Back" inteiro (só trechos nas redes). Mas preciso.