e por falar em baby jane...
#24: a newsletter de hoje é pra recomendar: filme antigo, série de fofoca, podcast de crime, disco de amorzinho e curta sobre homofobia
senhores, (ler com a voz da bethania)
se tem uma coisa que este leitor preza muito é título bonito. a obra em questão pode até se dar o luxo de ser mediana se o título for algo que me arrebate. tem quem prefira que digam logo a que veio no nome. mas eu prefiro o mistério, a poesia escondida ali, aquela referência marota. se o título for longo então, uma sentença que vai ficar ecoando muito tempo depois de lido, aí eu caso.
alguns dos meus livros preferidos ganharam meu coração já no nome e lá no fim desta newsletter eu faço uma lista com 10 deles.
também nesta edição, minhas mais recentes obsessões: o filme o que terá acontecido com baby jane?, o podcast a mulher da casa abandonada e o novo álbum do jorge drexler.
vem comigo!
FILME
o que terá acontecido com bette e joan?
filme sobre o próprio cinema é um dos meu gêneros preferidos. se tem algo que ~agrega valor~ a um roteiro é ele ser ambientado nos bastidores da indústria. o crepúsculo dos deuses, cantando na chuva, história de um casamento, o exorcista, cada um em seu gênero, são bons exemplos de obras trabalhadas na metalinguagem. um dos meus filmes preferidos, daqueles que me deixam obcecado lendo tudo sobre ele cada vez que eu vejo, é o que terá acontecido a baby jane? (what ever happened to baby jane?, 1962 de robert aldrich).
nesta semana eu tive a chance de rever o filme de 1962 e em seguida, conferir finalmente a série feud: bette and joan, de 2017 que o ryan murphy fez sobre os bastidores deste filme e a rivalidade entre suas estrelas, bette davis e joan crawford nos bastidores. tenho um pé atrás com quase tudo que murphy faz, que tem ótimas ideias que vão se desfazendo conforme as tramas avançam. mas a curiosidade sobre mais detalhes da lendária rixa entre as maiorais de hollywood falou mais alto. eu amo uma fofoca.
e, apesar de patinar na narração e em alguns detalhes, a série tá bem boa, sobretudo na reconstituição e no desempenho das monstras susan sarandon e jessica lange como davis e crawford, respectivamente. sarandon conseguiu absorver com perfeição quase assustadora os menores detalhes de bette davis, tanto no civil quanto na pele de baby jane. é de parar para apreciar.
já o filme, que eu não via há quase uma década, nunca decepciona, é uma dos melhores terrores psicológicos já feitos, além de ser o maior embate entre atrizes já visto no cinema, dentro e fora das telas. a trama, densa e cheia de reviravoltas e grandes momentos, conta com duas atuações esmagadoras de de davis e crawford, que travavam embates dentro e fora de cena, já que as duas se odiavam.
na história, baby jane hudson (davis) é a sombra de um passado distante, como popular atriz mirim de vaudeville cuja irmã blanche (crawford) sempre foi um patinho feio. os anos passam, as irmãs crescem e a situação se inverte, e é jane que precisa se escorar na poderosa irmã para conseguir algum sucesso, e uma carreira promissora é enterrada de vez quando um misterioso acidente deixa blanche paralítica.
já velhas e aposentadas, baby jane é uma mulher que vive com sua mentalidade infantil, ou seja, uma criança que cresceu demais. alheia ao mundo ao seu redor, ela ainda acha que tem sucesso e que simplesmente poderá voltar aos palcos com seu número. seu desprezo pela irmã só a faz mais cruel e insensível, e ela entrega ótimos momentos de loucura.
já joan está igualmente bem, dentro das limitações físicas e psicológicas de seu personagem. blanche é uma pessoa amargurada, mas que está tentando se redimir e ainda guarda esperanças de conviver pacificamente com a irmã, agora que estão ambas depois dos 50. a composição da personagem é interessantíssima e ótima de se observar nas três fases da trama, e mostram que blanche hudson não é tão inocente quanto se pensa. vale a pena demais ver, o filme está na hbo max e a série, no starplus.
. . .
e por falar em baby jane, o que me levou a procurar o filme para rever foi o podcast a mulher da casa abandonada, do jornalista chico felitti. com um episódio por semana, o programa conta a história real de mari, excêntrica moradora de higienópolis, são paulo, que vive em uma mansão caindo aos pedaços, só é vista com a cara cheia de pomada branca e passa o dia entre devaneios, como uma baby jane da vida real.
mas mari não é quem diz ser, e chico vai atrás da história desta mulher. por trás do nome inventado ela esconde a acusação de ter cometido nos eua, vinte anos atrás, um crime hediondo. não duvido nada ela ter uma irmã presa na casa numa cadeira de rodas. o podcast até agora só tem dois episódios, mas é tão bem feito que vale esperar uma semana inteira para ouvir uma nova parte.
DISCO
o álbum branco de jorge drexler
há muito tempo eu não ouvia um disco inteiro que fosse todinho tão bom. tinta y tiempo, o último álbum do uruguaio jorge drexler me ganhou nos primeiros versos da primeira música:
“corría la era del mesoproterozoico
cuando aquella célula visionaria
en un acto inaudito, tirando a heroico
tuvo una idea revolucionariacansada ya de dividirse sola
vio con buenos ojos a otra célula vecina
decidió mezclarse, aprendió a reírse
y nació aquella historia del huevo y de la gallinasin saberlo había inventado el amor y el sexo”
el plan maestro (jorge drexler)
o disco é inteiramente dedicado ao amor, sem nenhuma vergonha de assumi-lo. desde a canção primeira, sobre como todos os nossos instintos de amar e transar são na verdade programados pela biologia. canções sobre encontros, escolhas, luto e sexo, cada uma mais deliciosa de ouvir que outra. sério, tocarte, em parceria com tangana é uma das coisas mais tesudas que já ouvi. outra muito boa é oh, algoritmo, sobre o amor na era das redes sociais em que ele pergunta: “quem quer que eu queira o que eu acho que quero?”. muito bom.
ouça aqui:
CURTA
desculpe não fazer você sorrir
junho é o mês do orgulho lgbtquia+ e é nessa época que o povo animado corre para levantar as discussões e pautas importantes, no rastro da visibilidade que esse calendário traz. no dia 15 começou o digo - festival da diversidade sexual e de gênero de goiás, que tem uma porção de mostras e mesas interessantes. dá uma conferida no site deles.
eu deixo aqui a recomendação do curta desculpa não fazer você sorrir, produzido e estrelado pelo meu amigo, guto rocha. é um vídeo com uma mensagem forte, no tom certo para sempre lembrar que, apesar de ser considerado um povo alegre, a população lgbtqia+ do brasil sofre violências todos os dias em um país tomado pelo fundamentalismo. pra assistir, basta acessar aqui ou no player abaixo.
LISTA
10 livros com títulos incrivelmente bonitos
o deus das pequenas coisas (arundhati roy)
eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios (marçal aquino)
a ridícula ideia de nunca mais te ver (rosa monteiro)
cartas para um jovem poeta (rainier maria rilke)
a insustentável leveza do ser (milan kundera)
um rio chamado tempo, uma casa chamada terra (mia couto)
enterre meu coração na curva do rio (dee brown)
uma aprendizagem ou o livro dos prazeres (clarice lispector)
do amor e outros demônios (gabriel garcía marquez)
se um viajante, em uma noite de inverno (ítalo calvino)
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júnior bueno é jornalista e vive em buenos aires. é autor do livro cinco ou seis coisinhas que aprendi sendo trouxa, disponível em e-book na amazon.
Também não resisto a títulos grandes!
Alguns dos meus favoritos, livros e títulos: Cidades afundam em dias normais (Aline Valek, gosto muito de tudo que ela escreve, do podcast também), ninguém morre sem ser anunciado (Paula Gomes, muito divertido), É assim que se perde a guerra do tempo (Amal El-Mohtar e Max Gladstone, que é simplesmente lindo) e My Grandmother Sends Her Regards and Apologises (Fredrik Backman, um dos meus preferidos dele, lindo também).