e o oscar não vai para...
às vezes é melhor ficar na plateia sorrindo amarelo que subir ao palco pra pegar o prêmio
ladies and gentlemen,
é engraçado observar como mudamos com o correr dos anos, né? por exemplo, até um par de anos eu era a cadelinha do oscar. passava metade do ano comentando a premiação e a metade seguinte já prospectando a do ano seguinte. e mal saía a lista dos indicados eu saía doido pra ver todos os filmes, dando ✓ no máximo de coisa possível pra poder comentar a premiação com propriedade.
claro que isso era também por força da profissão, eu escrevia sobre cultura para um jornal e me esmerava em fazer boas análises e críticas. e olha que pra ver tudo era bem difícil já que os filmes demoravam pra chegar no brasil e mais ainda em goiânia. então sempre rolava aquele torrent maroto pra tentar dar conta da lista. hoje em dia, tendo acesso a mais de dois streamings, e com tempo e grana pra ir mais ao cinema, cadê que eu vi filme do oscar? simplesmente me deu preguiça.
prefiro esperar o movimento, ver a premiação (claro, eu ainda gosto de ver a cerimônia) e depois ver alguns filmes que me interessarem. alguns eu até vi e falei deles aqui. eu percebi que naqueles anos, teve filme que eu vi e nem me lembro porque não me conectei com ele, só ficava reparando em detalhe técnico pra catalogar ele numa lógica de premiação, que é mais de mercado que necessariamente de arte.
um hábito que eu abandonei e, por hora, não me arrependo, é o “ter que” conhecer ou consumir algum produto cultural. cada um faça o que quiser da própria vida, mas eu, particularmente não leio um livro só porque todo mundo tem que ler, ou vejo uma série apenas com um argumento que todo mundo tá falando dela. deveria ler mais e ver mais filmes, confesso, mas se isso é gerado apenas por uma demanda externa (fulana lê 80 livros por ano) que pelo prazer de uma boa experiência.
e vocês? como se relacionam com a demanda cada vez maior de filmes, séries, livros, álbuns, podcasts, etc etc?
na newsletter de hoje, uma coleção de mancadas do oscar, uma história triste envolvendo uma música da angélica e uns bons links pra vocês. vem comigo!
OSCAR VACILÃO
as injustiças do hominho dourado
todo crítico de cinema tem em comum duas coisas: primeiro, dizer que não liga muito pro oscar, porque é prêmio da academia americana pra agradar o gosto americano, que é um prêmio que não preza a qualidade, mas a campanha de cada filme, que a cultura de massa blá, blá, blá… (dormi no segundo blá). o segundo traço em comum é acompanhar a premiação, fazer análises, comparar históricos e reclamar das premiações assim que os ganhadores põem a mão no hominho dourado.
porque entra ano e sai ano e o oscar sempre apronta uma de dar um prêmio prum bocó que ninguém vai mais lembrar depois ou um filme que não é nem de longe o melhor entre os indicados. é uma premiação política? sim. mas é divertido? muito. pois bem, como esse espaço prima pelo lado divertido da coisa, vamos aqui deixar de entrementes e fazer desse espaço uma homenagem àqueles que não ganharam o prêmio mesmo merecendo muito.
começando pelos dois grandes cineastas da era de ouro de holywood, chaplin e hitchcock. apesar de serem considerados gênios e produzido filmes célebres como luzes da cidade, o grande ditador, psicose e janela indiscreta, pra ficar só nos meus preferidos, eles nunca ganharam um oscar de melhor filme ou diretor. claro que depois eles ganharam aquele prêmio honorário pelo “conjunto da obra”. mas aí já era tarde, né? sabe aquele doce com sabor amargo? então.
os anos 70 foram pródigos em filmes que mostraram do que novo diretores eram capazes, abandonando o cinemão épico da velha hollywood e metendo o pé na porta, trazendo pras telas sexo, drogas e rock’n’roll. mas eles foram esnobados, um por um. laranja mecânica, hoje o cult supremo do kçubrick perdeu pra operação frança em 71, apocalipse now, do coppola perdeu pro drama familiar kramer versus kramer em 80 e o mais inacreditável: em 77, taxi driver, do martin scorsese perdeu feio para rocky um lutador. apesar de gostar dos vencedores, não dá pra negar que foram injustas essas escolhas. os caras fizeram história, pô!
o scorsese, aliás, penou pra levar uma estatueta pra casa. além de taxi driver, touro indomável, gangues de nova york e o aviador foram indicados, elogiados, alvo de apostas e morreram na praia. fora a sacanagem que é ver o filmaço os bons companheiros perdendo pro adulado e incrivelmente ruim dança com lobos. sério, o que as pessoas viam no kevin costner? tio martin só foi saber como é ter um oscar em casa em 2007, com os infiltrados, que nem é o melhor filme dele, aliás nem era o melhor filme daquele ano. coisas da academia.
fargo deveria ter ganhado em 1997, mas foi o paciente inglês (chaaaaaato) quem levou. ligações perigosas é incrivelmente melhor que rain man, o vencedor de 1989. entre dois amores, vencedor de 1986 não chega aos pés de a cor púrpura. o segredo de brockeback mountain amadureceu o cinema para a histórias mais sexualmente diversas e era o grande filme de 2006, tanto que o diretor ang lee foi premiado, mas pra melhor filme escolheram a bomba crash – no limite (beleza de subtítulo, inclusive). não dá pra entender.
o artista (2012) é bom? até é, mas melhor que hugo cabret (do scorsese, olha só), jamais será. e a jeniffer lawrence pode mesmo ser a pessoa viva mais legal de hollywood, mas ganhar de emmanuelle riva em amor é pedir muito.
quer mais? em 93 anos de premiação apenas por oito vezes uma mulher foi indicada como melhor diretora. não é possível que haja tão pouca visibilidade assim, quando se pode contar pelo menos uma dezena de filmes medianos feito por homens, sendo indicados e ganhando.
racialmente o panorama é tão feio quanto. o ano passado a diretora cloe zhao se tornou a segunda pessoa não branca a vencer a categoría (ang lee é o primeiro). ou seja, nenhum diretor negro ganhou a estatueta, mesmo existindo monstro spike lee e agora o talentosíssimo jordan peele em atividade.
por falar em racismo, o que dizer do condescendente green book, que fala da segregação estadunidense do ponto de vista de um homem branco, ganhado de infiltrado na klan em 2019? ou seja, até quando quer ser progressista, a academia derrapa. e feio.
em 1999 aconteceu o que parecia impossível: quase toda a premiação (pelo menos as categorias principais) foram cagadas equivocadas. para começar, shakespeare apaixonado levando o oscar de melhor filme num ano em que o resgate do soldado ryan, elizabeth e além da linha vermelha estavam no páreo. depois tem gwyneth paltrow, aquele picolezinho de chuchu sendo premiada como a melhor atriz do ano. num ano em que meryl streep, cate blanchet, emily watson e (heresia) fernanda montenegro concorriam. sério, se a carla perez ganhasse por cinderela baiana seria mais justo.
mas o pior estava por vir. todo mundo achou a vida é bela um filme bonitinho. mas depois do roberto begnini subir nas poltronas, fazer um discurso embaraçoso sobre levar todos pra marte e transar com geral, e fazer o tio chato falando um inglês macarrônico, todo mundo concorda que era mais negócio premiar o brasileiro central do brasil, né? e o pentelho ainda levou a estatueta de melhor ator, ganhado do tom hanks, nick nolte, ian mckeller e o edward norton, em papéis arrasadores, qualquer um aí seria melhor escolha.
mas esqueçamos 1999. pra terminar esse já extenso relato vão duas curiosidades pra contar no boteco:
1 - meryl streep hoje é sinônimo de oscar, já que ela tem 21 indicações no currículo, sendo que já ganhou dois de melhor atriz e um de coadjuvante. desde que começou a ser indicada em 1979, tem uma média de uma indicação a cada dois anos. o curioso é que já faz algum tempo, a maioria das atrizes que ganharam o oscar, terminaram seus casamentos logo em seguida. julia roberts, charlize therón, hillary swank, halle berry, kate winslet, reese witherspoon… o caso mais notório de vítima do douradinhoo foi a sandra bullock, que descobriu um caso do marido uma semana depois da cerimônia. merryl streep continua casadíssima, é bom que se diga, e deve ter a melhor mãe de santo do mundo.
2 - a tradição manda que o ator que ganha um ano apresente a premiação de melhor atriz do ano seguinte, assim como atriz apresenta a de ator, etc. isso gerou uma lenda que muita gente jura que é verdade, a do oscar que marisa tomei levou por acidente. jack palance (aquele mesmo do programa acredite… se quiser) era já velhinho em 1992. e como havia ganhado como ator coadjuvante um ano antes deveria apresentar a categoria atriz coadjuvante. vanessa redgrave era a favorita e marisa o grande azarão da noite.
o que se conta é que, sem óculos, palance não conseguiu ler o nome no envelope e no teleprompter o último nome anunciado era o de marisa, indicada pela comédia insossa meu primo vinny. aí na hora ele mandou o nome dela e ficou por isso mesmo. até hoje há quem jure que isto aconteceu. fato é que, mesmo com o oscar a carreira da atriz (a tia may deste último homem aranha) passou por vários percalços, e ela ficou muito tempo sumida das telas.
como se vê, às vezes é melhor ficar na plateia sorrindo amarelo que subir ao palco pra pegar seu prêmio.
PICOLÉ DE LIMÃO
a maldição do hit de verão
[gatilho: suicídio]
quem é old millenial como eu certamente se lembra que angélica, a elegante senhora hulk, ali pela década de 90, tinha a mania de arruinar nossas músicas preferidas com versões absurdamente trash. foi assim com linger, do cramberies, que virou a famigerada se a gente se entender e light my fire do the doors, que a loira converteu para baby bye que bye bye bye.
pois bem, esta semana eu estava assistindo à ótima série veneno, quando em uma cena, um rapaz toca um trecho de uma música: “un limón y medio limón, dos limones y medio limón” e na hora eu pensei “peraí, eu conheço essa música!”. e sim, angélica em 1996 gravou uma versão chamada dança dos 40 limões, versão de dudu falcão para la danza de los 40 limones, de juan antónio canta, que havia sido o hit do verão naquele ano na espanha.
apesar do tema alegre, a canção gerou um trauma no autor original e desencadeou uma tragédia. juan antonio canta, nascido juan antonio capillo, foi um cantor/compositor de fama moderada entre o fim dos anos 80 e o começo dos 90. depois de sair da banda pabellón psiquiátrico, se lançou em carreira solo com o álbum las increíbles aventuras de juan antónio canta. suas músicas eram cheias de críticas à sociedade de consumo, a desigualdade, enfim ~tudo que está aí~.
era o disco certo no momento errado. isso porque entre as faixas, uma sobressaiu mais que as outras, el rap de los 40 limones. chamado a cantar na televisão, o rap cheio de ironia e fúria foi reduzido ao refrão que contava limões até chegar a 10 e meio. logo, um compacto, em ritmo de festa, só com a parte alegre da letra foi lançado, rebatizado de la danza de los 40 limones.
figura fácil no programa esta noche cruzamos el mississipi, o cantor contava seus limões rodeado de dançarinas sensuais, mas sempre de terno negro, pose austera e sem nunca sorrir. isso bastou para torná-lo um sketch recorrente. mississipi era um programa de entrevista que passava à meia noite e tinha de tudo: travestis, violência urbana, humor duvidoso e erotismo. tudo explorado com bastante sensacionalismo. algo que faria o ratinho corar de vergonha e o gugu parecer uma freira.
sua canção de maior êxito se tornou seu pior pesadelo. um jogo de palavras que triunfou, essa foi a sua sentença. canta não podia apresentar outra coisa que não fosse os limões em seus próprios shows. o público vaiava e iterrompia até mesmo os versos da música que não eram o estribilho. estavam ali pelo refrão, não para ouvir canções poéticas e políticas.
ele se tornou um gênio incompreendido, prisioneiro de um sucesso que não queria alcançar. não dessa forma, pelo menos. um compositor que valorizou uma obra de muitos quilates, mas que chegou ao topo com algo que odiava: a música do verão. em 22 de dezembro de 1996, o artista se matou, aos 30 anos, vítima de uma enorme depressão. ironicamente seu único grande hit cruzou o oceano e, feito à medida para a audiencia infantil, acabou caindo nas graças dos fãs da solar e alegre fada bela.
CINCO OU SEIS LINKS
o rapper colombiano residente, ex vocalista do calle 13 lançou um petardo esta semana, o clipe this is not america. com imagens fortes de conflitos em todos os países latino-americanos, incluindo o brasil, o vídeo é vibrante, urgente e necessário.
cheguei atrasado para falar de veneno, mas finalmente me rendi. é uma série incrivelmente bem realizada e mexeu comigo como há muito tempo uma série não o fazia. pra quem não conhece, vale a pena conhecer a trágica e cômica história da travesti mais famosa da espanha.
tenho jogado contexto com meu namorado todos os dias. é um jogo de advinhar palavras através de um algoritmo. você escreve uma palavra, e te dizem o quão perto ela está da palavra secreta. parece complicado, mas na prática é bem divertido.
hey, chegou até aqui? pois se gostou ao ponto de ler até o fim, que tal apoiar essa publicação autoral, independente, sem recurso e sem assinaturas? eu ainda não tenho pix, mas você chamar na dm que a gente dá um jeito. qualquer quantia é bem-vinda, é só pensar quanto você investiria numa assinatura de um conteúdo que você curte. outra forma bacana de ajudar é compartilhar com quem você acha que gostaria de ler meu conteúdo. desde já muito obrigado!
júnior bueno é jornalista e vive em buenos aires. é autor do livro cinco ou seis coisinhas que aprendi sendo trouxa, disponível em e-book pela amazon.
Eu tive uma fase cinéfila quando tava na faculdade de Jornalismo - até porque na época eu só andava com a galera do curso de Cinema, praticamente. Com a convivência acabei indo não só a vários cinemas de rua do Rio e de Niterói, como ao Festival do Rio, Sessão Cineclube e Maratona no Cine Odeon, Cine Arte UFF, pré-estreias e festivais temáticos - além, é claro, do que eu via em casas de colegas, nas aulas (cheguei a puxar algumas disciplinas) e em casa mesmo, com indicações deles.
Mas depois que perdi contato com a maior parte do pessoal, a preguiça bateu forte. Em cinema, assim como em outras artes, eu só procuro o que me interessa, o que me desperta curiosidade (e aí já respondo à pergunta do outro tópico). Mas mesmo assim, às vezes nem o que quero ver eu consigo me mobilizar pra assistir. Faz tempo que não vou ao cinema.
Já em relação ao Oscar, sinceramente, nunca tive esse fetiche, nem na fase que eu citei acima. Claro que já vi algumas cerimônias, mas sempre achei chatinho, me dá sono. Eu quase nunca vejo os filmes, não entendo as referências dos apresentadores, então fico boiando. E eu não conheço muito ator gringo, diferentemente dos daqui. Como costumo dizer: as pessoas falam em Jennifer Lawrence, e eu só entendo Jacqueline Laurence.
Eu não tenho paciência pra assistir premiação, me dá um sono, hehe.
Ultimamente eu só leio ou vejo coisas que realmente me dão vontade, claro que eu tento diversificar, mas se é algo que todo mundo gosta e eu sei que não é pra mim, eu desencano. Li um dos livros do ano do Goodreads há um tempo atrás e achei tão ruim, mas tão ruim, eu odeio quando isso acontece porque eu me pego pensando por que será que as pessoas gostaram tanto disso gente, será que eu li errado, sabe? Hehe. Acontece. Acho que com o Oscar é a mesma coisa, além das campanhas etc, as pessoas que votam gostam de certo tipo de coisas e é isso, não dá pra fugir muito disso. Concordo com todas as suas opiniões, acho que há mais injustiçados do que merecedores, mas é o mundo, né?