britney filme estrada
#131: 50 pensamentos que tive ao reassistir o clássico do cinema moderno "crossroads: amigas para sempre"
a idéia para o texto a seguir veio de uma mensagem que o leitor arthur deixou lá no formulário da newsletter. ele diz que gostou muito de dois textos recentes sobre música pop e queria ver mais textos sobre divas pop. segundo ele, “esses ícones se estabelecem como figuras afetuosas em nossas vidas e como se associam às nossas memórias - sobretudo as cantoras.” como eu já estava pensando em escrever sobre britney spears, logo, achei o momento ideal.
arthur querido, obrigado pela mensagem. e para vocês, se quiserem sugerir temas, fazer perguntas ou mandar um recado, abra seu coração aqui.
olá vocês!
quando britney spears era a princesinha do pop, eu estava na minha fase mais roqueira, indo atrás de todas as discografias de todas as bandas que meus amigos citavam no meio de um papo casual. logo a minha reação à carreira dela oscilava entre ignorar ou detestar. a cantora representava tudo que minha skin daquele momento desprezava: não era rock e era um produto para garotas. quem diria que décadas depois eu seria essa maricona gravando tiktok com a coreo de apple da charlie xcx. enfim, a hipocrisia.
em 2002, quando lançaram o filme crossroads, estrelado por britney spears eu fiz aquela careta de adolescente idiota, sabe? com o dedo em arminha fingindo dar um tiro na própria testa, seguido de meter o dedo na goela e fingir que vai vomitar. mas confesso que quando passou, anos depois, na tela quente, eu vi todinho. mas para poder falar mal. é um traço geracional eu creio, garotos deviam odiar britney. tanto que depois de sair do armário e começar a conhecer suas músicas (não há porta de armário que resista ao clipe de toxic), eu ainda fazia a linha de fã irônico.
pois bem, o tempo passou e eu comecei a consumir suas músicas. confesso que foi a versão do travis para baby one more time que me abriu os olhos, tinha algo ali. e claro, acompanhar seu calvário, (sofrendo todo tipo de abuso de sua família, da opinião pública e dos meios de comunicação, surtando, lutando, se tornando livre e buscando se recompor), mudou muito a forma com que eu a via. e lendo sua biografia, me deu vontade de rever seu filme e escrever sobre ele.
primeiro, um contexto: brit estava no auge de sua popularidade, tudo que ela tocava virava ouro. logo um filme estrelado por ela era questão de tempo. se elvis, os beatles, as spice girls e até sandy e júnior surfaram nesta onda, porque não a britoca? será que, passados 22 anos a minha percepção mudou ou ele segue ruim?
a seguir vou listar algumas das coisas que pensei revendo este clássico do cinema pós-moderno:
o filme abre com as protagonistas lucy, mimi e kitty ainda crianças. e a garota que acharam para fazer a britney é idêntica, até o mesmo corte que ela usava na época do clube do mickey. (nos créditos finais eu descobri que é jayme lynn spears, irmã da cantora.)
as mini queridas enterram um tesouro e juram que vão resgatá-lo na noite de formatura. e juram também ser amigas para sempre.
a primeira cena de britney é dançando de calcinha e sutiã no meio do quarto. nada que ela não faça diuturnamente em seu instagram. a música é open your heart da madonna. vendo ela cantar junto, acho que seria um bom cover.
eu queria viver em um mundo onde um álbum chamado “britney sings madonna” fosse viável.
anos se passaram e as ex-amigas se odeiam. britney é lucy, a garota estudiosa e virgem, zoë saldana é kitty, a mean girl do colégio e taryn manning é mimmi, uma jovem desajustada e grávida.
eu acho que a pennsatuck de orange is the new black é meio que a evolução de mimi. não sei explicar, só sinto que é a mesma personagem só que com adição de heroína.
é estranho pensar em um mundo onde britney spears não é a pessoa mais popular da escola. olha pra ela, a garota é magnética.
a bem da verdade, elas como adolescentes têm a vibe hebe camargo fazendo a julieta, né? mas vamos comprar.
lucy está chorando em seu quarto e diz: “eu me esforcei muito para ser a oradora da turma”, dá pra ver que nem mesmo brit acredita nas palavras que saem de sua boca.
em duas falas com o pai entendemos que: 1 - ela não sabe bem o que quer, 2 - mas não quer ser médica, 3 - este é o sonho de seu pai e 4 - a mãe a abandonou ainda criança.
o vestido de formatura dela é muito lindo, o tom de rosa pálido com bordados prateados. é bem miu-miu. e o penteado tá bem lindo também. e o de kitty, todo em pink é divino, um modelo midi que valoriza as pernas esguias de zoë.
e a sombra azul turquesa da kit. ela era uma it girl da época, uma proto-blogueira. eu posso imaginar essa garota com um tiktok, fazendo um “arrume-se comigo” e ensinando a fazer esse esfumado colorido.
justin long novinho, no papel do nerd com quem britney pretende perder a virgindade. 20 anos depois e ele segue fazendo este tipo: o cara desajeitado que sai com a gostosa e se sente inseguro. não tô mentindo, dia desses eu vi ele fazendo isso na primeira temporada de mom. e, por alguma razão eu acho isso sexy nele.
ok, menos de 10 minutos e temos duas cenas de britney de calcinha e sutiã. imagina se o filme não fosse roteirizado e dirigido por mulheres. (a propósito, a roteirista é ninguém menos que a hoje todo-poderosa shonda rhimes.)
por aí dá pra ver como a sexualidade dela era explorada de todas as maneiras.
mimi dá um soco na boca do ex-namorado por dizer que ela “deixou um cara transar com ela no banco de trás nas férias de natal”. é um soco e tanto, guarde esta informação.
afastadas até 5 minutos atrás, lucy, kit e mimi decidiram que vão fazer uma viagem de carro para a califórnia juntas. mimi quer fazer um teste para uma gravadora; lucy quer encontrar sua mãe; kit quer visitar seu noivo.
lucy arrisca seu plano ao ir deixar um bilhete na mesa de cabeceira do pai. ela não poderia simplesmente ter deixado o recado na porta da geladeira, como todo mundo? essa é garota mais inteligente da turma.
elas têm um carro? não. elas têm um plano? não. mas elas têm o contato de um
gostosomúsico que aceita dar uma carona pra elas. então temos início a nosso road movie.lucy de chapéu balde reversível. eu tô meio obcecado pela moda desse filme, os looks são icônicos.
a rádio do carro toca bye bye do ‘nsync. o namoro de britney e justin timberlake tava no auge, lógico que iam citar ele de alguma maneira. e isso me faz lembrar de como ele foi escroto com ela. (desculpa, ainda não consigo não detestar este homem).
as três garotas estão convencidas de que o motorista pode ser um serial killer. no entanto, elas ainda entram no carro com ele? isso não deve ter me afetado quando vi o filme antes, mas agora eu só penso nos pais e mães dessas meninas. devem estar se matando de preocupação enquanto elas cruzam o país com um desconhecido.
o carro quebra e elas precisam de dinheiro para consertar (e comer, e ficar em um hotel). e a maneira que elas encontram de levantar dinheiro fácil é… cantar em um karaokê. sério. se isso funcionasse eu nunca mais teria dívidas, pois sou bom em karaokê e ruim de finanças.
as roupas delas meio punk rock, o cabelo da lucy perfeitamente frisado, a atitude delas no palco. e os cintos com spikes. é tudo muito icônico.
espera, eu tô achando esse filme… bom?
quanto dinheiro elas ganharam? estão num hotel bom, torrando do frigobar e pedindo serviço de quarto. a bem da verdade elas serviram muito no cover de i love rock and roll da joan jett.
as garotas roubam a chave do músico gato e potencial serial killer e tomam a direção do carro. no rádio, o hino men i feel like a woman. a trilha sonora é recheada de hits. o boinitão desperta e começa a dar um chilique idiota porque tá rodeado de “coisas de menina”.
bonitão revela que sim, esteve preso, mas que não, ele não é um assassino. foi pra cadeia porque levou sua irmã, vítima de violência familiar, para viver com ele em outro estado, coisa que, por ela ser menor, é considerado crime. corta pra ele dirigindo um carro por outros estados, com três menores.
na minha cabeça, não sei porque, esse filme era um musical. eu tinha certeza que do nada a britney começava a cantar no meio de uma paisagem. mas essa cena é do clipe de i’m not a girl not yet a woman. o que acontece é que ela mostra pro cara um poema que escreveu que é a letra dessa música.
mimi ensina kit a golpear, guarde esta informação.
lucy finalmente conhece sua mãe afastada, que é interpretada por ninguém menos que kim cattrall, a samanta de sex and the city. esse filme fica cada vez mais icônico. a mãe de lucy é uma dona de casa chique que não quer nada com ela. então nós a odiamos, obviamente. mentira eu nunca odiaria kim cattrall.
algo errado não está certo: a mãe de lucy diz que se foi porque nunca quis ser mãe. mas têm outros dois filhos e parece cuidar muito bem deles. qual é o conflito com o pai da lucy? o que de fato aconteceu para ela ir embora? jamais saberemos. mas não confio 100% no pai dela.
aliás, nem na fição a britney poderia ter pais minimamente decentes?
lucy volta para as amigas e bonitão mostra pra ela que fez uma música pro poema dela. eles cantam juntos. que lindo ver a briney cantando, parece em paz. não é a melhor voz do mundo, mas ela canta com muita verdade, eu quase choro. o mundo a machucou demais, e eu tô quase virando o caio do bbb quando viu o documentário sobre ela.
do nada, temas sombrios vieram à tona. kit confessa às amigas que a relação conturbada que tem com a mãe faz com que ela tenha uma imagem distorcida de seu corpo, causando transtornos alimentares. mimi revela que sua gravidez é fruto de um estupro e que pretende dar o filho em adoção.
eu fui ver uma comédia leve e do nada a coisa toda virou um drama denso. shonda rhymes já treinando como iria traumatizar audiências nos anos seguintes.
a viagem tá quase no fim, mas dá tempo de mais uma canção icônica: if makes you happy, da sheryl crow.
finalmente, a califórnia. lucy e bonitão se dão bem, o noivo de kit dá um perdido nela e mimi molha os pés no oceano pacífico e decide ficar com o bebê.
kit vai atrás do noivo e descobre que: 1 - ele está traindo ela; 2 - ele não tem a menor intenção de se casar com ela; 3 - ele é o agressor sexual de mimi.
kit dá um socão na cara do noivo. this is absolute cinema.
a coisa resulta em mimi rolando a escada e perdendo o bebê. sério gente cadê a comédia adolescente?
enquanto isso, lucy e o bonitão transam. loucamente.
o pai de lucy vem atrás dela e grita histericamente. ela decide ir embora com ele. “como você pode sair assim com uma garota grávida?” sério, de todos os problemas esse é o único que te incomoda, meu senhor?
as amigas insistem que lucy deve fazer o teste para a gravadora e não mimi. apesar de que foi para mimi fizesse o teste que a viagem teve início. e que esse era o seu sonho. e que o filme todo se justificasse por isso. não importa, vamos apoiar esta outra amiga que nunca sonhou em ser cantora.
lucy desiste de ir embora, não sem antes dizer ao pai “eu não quero ser como a minha mãe, não me obrigue a te abandonar”. se o pai sentiu ou assimilou isso, jamais saberemos porque não houve nenhuma conversa.
ela sai do carro e vai beijar o boy na calçada.
lucy canta i’m not a girl not yet a woman com um top bastante curto e no entanto com mangas bastante volumosas. eu tô obcecado pela estética deste filme. como ele não é um clássico nível de repente 30 e o diabo veste prada?
ela conseguiu passar no teste? as amigas voltaram para sua cidade? o pai resolveu ser mais legal? nunca saberemos.
agora ela canta overprotected com outro top curto de mangas volumosas. intercalando com cenas de erros de gravações. eu amo quando fazem issso.
overprotected é uma música muito melhor que i’m not a girl e só a minha opinião importa.
ps: este formato é uma cópia homenagem à
ps do ps: o título é uma referência ao maravilhoso documentário gretchen filme estrada, da eliane brum, que tá disponível inteiro no youtube.
júnior bueno é jornalista e vive em buenos aires. é autor dos livros a torto e a direito e cinco ou seis coisinhas que aprendi sendo trouxa, disponíveis em e-book na amazon.
“elas como adolescentes têm a vibe hebe camargo fazendo a julieta” - que frase, senhoras e senhores. Parei de ler para rir alto.
não vi e não deveria ser capaz de opinar (como nos ensinou glorinha), mas tenho certeza de que este é um ótimo péssimo filme. hahaha